Por Mário Alex Rosa
Há milênios que ouvimos alguns recados que a natureza vem dando ao homem. Recado que vai desde olhe para mim, cuide de mim, não me maltrate. Sou sua parceira. Mas não é de hoje que assistimos uma devastação da natureza de um modo avassalador. Estão destruindo florestas, exterminando as montanhas e junto levando as águas, os peixes, os pássaros, as plantas, as casas e a vida humana. Ao que parece, o homem continua não ouvindo o recado vindo da natureza, basta ver o noticiário das catástrofes mais recentes. Há um colapso climático. A humanidade literalmente está sentindo isso na pele, como se dize. É o efeito estufa. Parece ironia, mas a natureza sabe o que faz, o homem não.
Este desabafo me veio quando lia o belo livro Balada do morro da alegria, de Raimundo Carvalho, com as delicadas ilustrações de Demóstenes Vargas. Com uma linguagem extremamente poética, os versos de cada quarteto vão se alinhavando junto com a tapeçaria e ao mesmo tempo a tapeçaria de um modo independente vai se irmanando com os versos do poeta. Há um amálgama nesse feliz encontro de dois amigos artistas. Aliás, é o quarto livro deles. Antes publicaram A terra dos pássaros, Balada do Velho Chico e Circo universal. Afora Circo universal, os outros três têm a natureza não propriamente de um tema fechado, mas são como um olhar sensível em que a poesia ou prosa poética cuidam da natureza. Eles chamam a atenção não por estarem diretamente ligados ao politicamente correto ou mesmo a algum engajamento social ecológico explícito. Pelo contrário, seus livros infantis trazem entre os versos os recados que sonham realizar: cuidar da natureza.
Embalados pelo ritmo, mas não só, vamos página a página lendo, ou melhor, quase cantando, porque em sua maioria todas as estrofes são praticamente pura música. Assim, somos levados pelos sons das palavras, das rimas, das rimas toantes, pela marcação métrica da redondilha maior, comum nas cantigas populares brasileiras. Mas o resultado cuidadoso sobre técnica de poesia só sobressai graças ao talento do poeta em deixar tudo naturalmente construído numa harmonia liricamente sonora. Esse embalo se forma tão intuitivamente que o final retoma o início, então voltamos a reler/cantar assim alegres por esse “recado do morro”. A epígrafe no livro parece dar a dica: “quem não encontrar poesia no infinitamente pequeno jamais a encontrará no infinitamente grande” (Murilo Mendes). Raimundo Carvalho e as belíssimas ilustrações de Demóstenes Vargas comprovam que o infinitamente pequeno é enorme nesse livro de uma alegria encantadora.
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Mário Alex Rosa é autor dos livros infantis ABC Futebol Clube (Aletria, 2015), Cosmonauta (Aletria, 2022) e Formigas (Impressões de Minas, 2024).
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