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A VOZ POÉTICA DE LÍGIA DABUL

Por Cecília Azuz


O tempo que leva, publicado pela editora Patuá, reúne 33 poemas recentes e inéditos da poeta Lígia Dabul. Visitando lugares, impressões e acontecimentos ao que parece dispersos, o livro registra tentativas de resgatá-los por meio das palavras. Conectados por ideias desdobradas do título – demora, condução, iminente e às vezes evidente desaparecimento – os poemas, nas suas linhas, nos espaços que criam, nos ritmos com que fluem, acabam se definindo uns com os outros e na invenção. Lembrar. O suposto futuro. Os feitos do instante. E da escrita que estala vazios e concede que presenças finalmente se tornem de alguma maneira audíveis. Confiram dois poemas do livro:


ROUND TRIP


Faz muito frio em York.

A rua é um apelo – agasalho

e sentido para a espera.


Área fortificada,

a memória

esmorece na contagem

regressiva


e finalmente


o ano novo – mais um que estala

como uma casca de ovo


quebrada e aberta

sobre nossas cabeças.


PRIMEIRA DE ANO


Creia,

o dia mal começa e

esta salva de receios

se propaga desde ontem

na praia aberta sem

vento, sem estrelas,

as luzes do

artifício.


Flores

devolvidas, algas

por onde pisa

a manhã com tudo

o que passou.


Você

dizia: um continente

inteiro a sotavento –

e agora que os fogos

deixaram rastros de

fumaça? Você queria

tanto - mas e esses vidros

na areia, aquela roupa,

a canga de alguém,

tudo impregnado

novamente

e os cegos à procura?


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