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Sete cânticos negros

Por Zilá Bernd*


Orikis: José Couto; Arte: Artur Madruga


O autor, José Couto, a partir dos chamados “saudação à cabeça” ou orikis, que são cantos rituais da tradição iorubá, compõe um livro primoroso, desvendando e revelando para os leitores a beleza e os mistérios de expressões da etnia iorubá, a qual se constitui como um dos maiores grupos étnico-linguísticos da África Ocidental, trazidos para o Brasil na condição de escravos. A apelação iorubá designa também a religião à qual pertenceu esse povo originário da Nigéria, tendo sido também designados, no Brasil, como nagôs.


O livro é composto por uma feliz parceria do autor José Couto com o artista gráfico Artur Madruga que, com sua enorme criatividade, ilustrou a obra, complementando, no imaginário do leitor, o que a escrita não poderia dar totalmente conta: o espírito iorubá, o colorido único correspondendo às cores da África, ajudando significativamente o leitor a visualizar e ou complementar o que a escrita dos orikis sugere. Assim à beleza e aos mistérios de expressões em iorubá, mescladas à língua portuguesa, se agregam imagens que, com seu colorido vibrante, auxiliam o leitor a interpretar e a se apropriar dos sete cânticos negros.


Para além dessa saudável aproximação de letra e imagem, a apropriação que ambos os autores – o escritor e o ilustrador – fazem dos orikis, os cantos de cabeça, que significam também, em iorubá, cantos para “louvar, saudar, evocar", agregam - tanto às palavras quanto às imagens – o axé, ou energia vital, que faz com que os leitores se transportem para o imaginário iorubá. A leitura e a visualização gráfica se associam para permitir aos leitores múltiplas interpretações da rica e poderosa cultura iorubá. Texto e imagem se harmonizam para nos proporcionar o prazer estético que uma cultura – diferente da nossa – pode provocar.


Assim, nós leitores, nos associamos a esses cantos rituais em louvor aos orixás, penetrando - através da palavra poética e do traço do ilustrador - no âmago da cultura iorubá que, em sua origem associava palavra, música e imagem.


Sete cânticos negros são pura poesia feita da associação de elementos rituais iorubás, de imagens e de sons, buscando reconstituir a própria origem dos orikis na qual diferentes elementos tradicionais se entrelaçam para remeter os leitores a acontecimentos remotos que tiveram sua origem com a criação do mundo.


Iniciando com a criação do mundo, na perspectiva da cultura iorubá, os poemas da primeira parte esclarecem o leitor sobre elementos da cultura africana como Oiá, o orixá dos ventos, o oráculo de ifá que a sabedoria e os búzios vão revelar, sendo que a segunda parte trata dos Orikis negros e índios, incluindo diversas regiões do Brasil como o Sertão, o Pantanal, o Índio guarani, o Cancioneiro guasca, entre outros.


Uma leitura que nos leva a um mundo distante da urbanidade e dos atropelos do dia-a-dia. Nos leva de volta a nossas origens, a antigos saberes, a rever culturas que foram opacificadas e esquecidas, trazendo à tona saberes que ficaram fora de circulação, mas que contêm contribuições substantivas para o nosso conturbado mundo contemporâneo.


Ler essa reunião de poemas faz bem à alma: proporciona o famoso saber com sabor de que falava Roland Barthes.

 

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*Pesquisadora 1 A CNPq. Academia Rio-grandense de Letras

 

Referência:

DANIEL, Cláudio.  Um breve toque de batá. Prefácio a Sete cânticos negros. p.  9 – 12. IN:  COUTO, José. Sete cânticos negros.

 



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